terça-feira, 24 de setembro de 2013

Estranha Obsessão



O silêncio era a marca registrada de Otávio. Nunca falava com ninguém. Mesmo assim aprontava. Gostava de se passar por vítima, mas na verdade adorava executar crimes.

O seu crime predileto era assaltar cuecas. Fazia de tudo para adquiri-las para si. Certa noite, Otávio pulou o muro de seu vizinho e de cara furtou três cuecas pretas que se encontravam expostas no varal. Justamente as cuecas que mais atraíam mulheres! Otávio não gostava de mulheres. Sentia asco.

Em outra noite, a sua cara de pau foi maior: ao roubar todas as cuecas sujas do seu outro vizinho, Otávio trancou-se no seu quarto e passou a cheirá-las incansavelmente. Sujas! As cuecas estavam sujas! Otávio teve a coragem de roubá-las e de passar horas com as narinas sugando aquele cheiro de sujo, testosterona e suor.  Como ele adorava o cheiro de suor! Otávio dava tudo por uma cueca bem suja e suada.

Outra noite não teve sorte. Ao tentar invadir o quintal do seu vizinho da frente, eis que nosso furtador de peças íntimas masculinas se depara com o próprio vizinho. Não pode ser!, pensou Otávio. Pela primeira vez era flagrado assaltando aquilo que mais lhe transmitia prazer: cuecas. E pretas. E sujas. E testosteronizadas. E suadas. Percebeu que o seu mundo, pobre mundo, agora pertencia ao vizinho da frente que o flagrou com a cueca na botija.

- O que você deseja, Otávio? Falava o homem com voz firme, forte e grave. Posso ajudá-lo com alguma coisa?

O homem se aproximava. Otávio assustava-se. Seu vizinho era alto, másculo e dava medo.

- Apenas pretendia roubar suas cuecas. (Otávio foi categórico. Assumiu o delito que iria cometer).

- Para que diabos você deseja as minhas cuecas e se você pode levar-me consigo?

Como assim? Aquele homem estava interessado num cleptomaníaco? Logo Otávio que adorava roubar cuecas?

Sim. Otávio despertara no homem um prazer sexual indescritível. Respondeu ao alto e forte homem:

- Posso levar-te mesmo? Olha que eu sou exigente. Lavo, passo e cozinho. Não abro mão de uma boa cueca suja, hein?!

- Serei todo seu, Otávio! Não terás uma boa cueca e, sim, uma bela de uma pica invadindo estes solos gordos e atraentes que guardas aí, bem abaixo!

Pela primeira vez o crime virou contra o crimoso: Otávio sentiu seu coração ser furtado por aquele homem que não sabe nem ao menos o nome. 

Amaram-se aquela noite. Otávio não se importou com as cuecas. Estava ocupado com outras coisas. Tinha outros dons (além, é claro, de roubar e cheirar cuecas).

E foi assim que Otávio se esqueceu das cuecas e tornou-se o ser mais falante do mundo: passou a desfrutar de prazeres e líquidos até então desconhecidos.

Aquele homem despertara nele o seu mais ínfimo desejo: ser surrado, amado e libertado. Surrado de prazer. Amado por alguém atraente, forte e áureo. Libertado da obsessão por cuecas.

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