quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Sempre Perto do Coração Selvagem de minha vida

''Nela havia uma qualidade cristalina e dura que o atraía e repugnava-lhe simultaneamente.'' 
(Clarice Lispector sobre Joana, a protagonista do romance Perto do Coração Selvagem)
Não. Não estou aqui para relatar todo o meu amor por Clarice Lispector. É de conhecimento de todos que a autora é uma espécie de musa para mim. Sei que Clarice compõe o mais alto sentimento que um leitor pode ter por seu ídolo. Seus romances, seus contos, suas crônicas, sempre representam algo muito forte para mim. Ao entrar em contato com Perto do Coração Selvagem, pude ter a certeza de que Clarice representa mais que um romance. Ela representa todo meu ser. Seja nos sentimentos reclusos ou nos mais expostos possíveis.

Quando li Perto do Coração Selvagem, eu me identifiquei muito com a protagonista deste romance, a Joana. Uma mulher de fibra, com atitudes animalescas, cheia de incertezas. Publicado em 1944, Perto do Coração Selvagem é o primeiro romance de Clarice Lispector e a minha primeira experiência em romances com a autora. Um romance que trava uma luta com o próprio subjetivismo, uma ruptura com o enredo tradicional e muitos outros elementos que fazem deste romance um diferencial em nossa Literatura.

O romance conta a história de Joana, menina órfã e que viveu a infância ao lado do pai, a quem confiou, por meio de brincadeiras, suas incertezas infantis. Sonhadora, contemplativa e, inconscientemente, provocava os adultos com suas questões e opiniões. Sua mãe, Elza, morreu quando ainda era muito pequena. Sendo assim, passa a morar com os tios. Logo nos primeiros dias de convívio, a dureza revela ares de hipocrisia. A relação de Joana com sua tia é tensa, mas conseguem viver sob o mesmo teto. Um dia, Joana rouba um livro quando vai às compras com sua tia. Tudo isso não passa de um teste para assustar a si e aos outros. Desaprovando esse tipo de conduta, a tia pede ao marido que encaminhasse Joana a um colégio interno, onde as diferenças, entre a menina e o mundo que a cercava, iriam se acentuar. A constante vocação para o mal e o desconhecimento de si mesma faziam parte do processo de descobrir-se, encontrar a razão de ser de sua existência. Durante este processo, surge um Professor que a aconselha, lhe dá ouvidos, mas tudo na medida do possível. Tal professor torna-se o amor de adolescente de Joana. O professor, casado, faz Joana sentir inveja da esposa e faz a pobre adolescente sofrer as dores de seu primeiro amor. Ao sair do internato, Joana casa-se com Otávio. Este, por sua vez, mantinha um relacionamento amoroso com Lídia, sua ex-noiva, a quem engravidou. Isso seria a causa da separação entre Otávio e Joana, além da diferença de temperamentos, expectativa de vida e compreensão de mundo do casal. Joana descobre o enlaço amoroso entre Otávio e Lídia e encara com naturalidade esta situação. Não provoca escândalo nem drama. No entanto, no seu interior, esse fato lhe causava muitas reflexões. Uma delas é o projeto de ter um filho com o marido, antes de devolvê-lo à rival. Isso não se realizou e Otávio partiu, deixando uma suposta promessa de volta no ar. Logo após a separação, Joana começa a ser seguida por um homem desconhecido durante algum tempo. Um certo dia, ela se viu na casa desse estranho e, sem sequer saber-lhe o nome, desejando conhecê-lo por outras fontes e por outros caminhos, com ele teve alguns encontros. O desconhecido que, para ela, era mais um salto para sua auto-investigação, um dia, acabou partindo. Por fim, Joana também parte. Embarca sozinha para uma viagem não muito bem definida, dando a entender que, naquele momento, teria condições de se resgatar. (Fonte Passeiweb)



Reconheço: identifico-me muito com Joana. A personagem possui certas atitudes que eu também tenho (ou tive, não sei ao certo) que já levaram a me perguntar e tentar descobrir quem verdadeiramente sou. Uma constante briga com o meu subjetivismo interior. É mergulhar a colher na tigela do inconsciente e nada sair desta. Ler Perto do Coração Selvagem me levou a ter uma visão mais profunda de mim mesmo. Pude entrar em contato com a minha introspecção. De início, o enredo parece um pouco incompreensível, mas é um romance que marca, que mexe com os íntimos de quem se dedica a esta história. 

Portanto, li e recomendo Perto do Coração Selvagem para todos que ainda nem se quiser chegaram perto do seu martírio interior. Assim como Joana, eu também busco uma definição para mim mesmo. Pude observar os meus conteúdos, os meus próprios estados mentais, tomando consciência deles. Um dia embarcarei sozinho para uma viagem e verei se tenho condições para resgatar-me. Não será fácil, mas farei o possível para, enfim, estar sempre perto do coração selvagem de minha vida.

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